Fonte: Observatório do Terceiro Setor
Em 2016, o Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social (IDIS) realizou a primeira edição da Pesquisa Doação Brasil, com o objetivo de trazer dados consolidados sobre a doação e o comportamento do doador brasileiro.
Após um intervalo de cinco anos, o IDIS, como apoio do Instituto Ipsos, realizou a 2ª edição da pesquisa para mapear as mudanças do cenário da doação no país e mostrar o efeito da pandemia de Covid-19 na cultura de doação.
Os resultados da pesquisa mostram que, apesar da onda de solidariedade observada pelo país, houve uma queda em todas as formas de doação, desde a doação em dinheiro, até a doação de bens e de tempo (trabalho voluntário).
Na edição com dados de 2015, a pesquisa apontava que 77% da população havia feito algum tipo de doação naquele ano. Em 2020, o percentual ficou em 66%. Do total de doações em dinheiro realizadas no último ano, 16% foram para causas relacionadas à pandemia.
Ao olhar para filtros específicos, a doação em dinheiro, por exemplo, caiu de 52% em 2015 para 41% em 2020. E, no caso de doações para organizações e/ou iniciativas socioambientais, foi de 46% para 37%.
Já a doação de bens caiu para 54% em 2020, contra os 62% que doaram produtos, materiais ou alimentos em 2015. Vale pontuar que dois terços dos doadores de bens no ano passado contribuíram com causas ligadas à pandemia, sendo que 27% doaram exclusivamente para iniciativas de combate à pandemia.
A queda no voluntariado foi ainda mais dura, com apenas 11% dos brasileiros realizando a prática. Em 2015, 34% responderam realizar algum tipo de ação voluntária. E mais da metade dos voluntários ativos em 2020 atuou em atividades ligadas ao combate à pandemia, sendo que 20% se dedicaram de forma exclusiva a esse tipo de iniciativa.
A doação total de 2020 teve uma queda significativa em comparação a 2015, quando foram doados R$ 13,7 bilhões – o equivalente a 0,23% do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil. Em 2020, o total de doações para o ano foi de R$ 10,3 bilhões, o equivalente a 0,14% do PIB.
Essa queda também influenciou na mediana do valor anual doado por pessoa. Enquanto, em 2015, o valor era de R$ 240, em 2020 caiu para R$ 200. A pesquisa utiliza a mediana para estimar o valor total doado, desconsiderando as doações extremas ou baixas demais, de forma a não influenciar na média.
“Observamos muitas articulações de coletivos e organizações para arrecadar doações [em 2020], seja de dinheiro ou de itens, que a queda causa uma certa surpresa. Contudo, faz sentido ter essa diminuição com o cenário de crise econômica e social que o Brasil vem enfrentando desde 2015. Brasileiros mais pobres, que também doavam, hoje necessitam das doações e do apoio das organizações sociais”, argumenta Paula Fabiani, CEO do IDIS, durante a Live de lançamento da pesquisa.
Para Renata Bourroul, consultora colaboradora do IDIS, apesar da queda, a pandemia proporcionou um cenário de fortalecimento de outros comportamentos essenciais para a cultura da doação.
“Quanto mais frágeis economicamente, menores são as doações das famílias. Mas, na medida em que houver uma retomada econômica, podemos esperar um aumento na proporção de doação. Tivemos um amadurecimento da sociedade brasileira que fortaleceu a confiança nas instituições. Hoje, existe uma maior disposição da sociedade civil para ser protagonista, tomar a bandeira e resolver os problemas sem esperar uma ação unilateral do Estado. A Sociedade Civil mais engajada e atuante é um dos legados da pandemia”, pondera.
De acordo com a 2ª edição da Pesquisa Doação Brasil, houve uma evolução em relação à percepção dos brasileiros sobre as Organizações da Sociedade Civil (OSCs). No total, 74% dos entrevistados consideram que as ONGs são necessárias no combate aos problemas socioambientais. Em 2015, a porcentagem era de 57%.
Além disso, 60% passaram a reconhecer que as ONGs fazem um trabalho competente e 45% concordam que as ONGs deixam claro o que fazem com os recursos que aplicam. Em 2015, apenas 28% se mostravam de acordo com essa afirmação. Outro ponto destacado é a queda dos que consideram que não devem falar que fazem doações, indo de 84% para 69%.
Renata Bourroul, consultora colaboradora do IDIS, argumenta que a comunicação é fundamental para o aumento da confiança nas organizações e para estimular a prática de falar sobre as doações, algo que pode esclarecer dúvidas que cercam o setor e atrair novos doadores.
“A comunicação tem um trabalho fundamental para reverter essa crença. As instituições precisam comunicar que, quando o doador fala que doou, ele não está sendo exibido, mas sim sendo um replicador do bem. Se a comunicação mostrar que não é exibicionismo, os números podem ficar mais positivos, porque isso cria uma rede de incentivo. Já demos um grande passo na melhora da imagem das organizações, algo que acreditávamos que levaria mais tempo para ocorrer. E se as organizações investirem nessa comunicação podem avançar ainda mais”.
Mudanças de causas
A pandemia, além de evidenciar o trabalho das organizações do terceiro setor, trouxe mudanças no perfil das causas que tendem a mobilizar mais a população.
Enquanto em 2015 Saúde e Crianças ocupavam os principais postos para a doação, em 2020 cresceu a adesão ao Combate à Fome, sendo citado por 43% da população como a causa mais sensibilizadora.
Além disso, duas outras causas ganharam maior relevância entre os entrevistados durante o intervalo entre as duas edições da pesquisa: o ‘Combate ao Abandono e Maus-tratos de Animais’ e os ‘Moradores de Rua’. Ambas tiveram baixas pontuações em 2015, mas aparecem no ranking de 2020, em quinto e sexto lugar, respectivamente.
Por que as pessoas doam e qual o perfil do doador?
A queda observada em relação às doações totais, contudo, não impediu que outro fenômeno ocorresse: mais de 80% dos brasileiros acreditam que o ato de doar faz diferença. Entre os não doadores, essa concordância chega a 75%.
A pesquisa ainda destaca que o conceito de que “a doação faz bem” para o doador foi de 81% para 91% da população nos últimos cinco anos.
Em relação ao perfil do doador, a pesquisa confirmou um padrão já observado em sua primeira edição: mulheres doam mais do que homens e ficam acima da média nacional. 41% das brasileiras fazem doações institucionais. Entre os homens brasileiros, o percentual cai para 32%.
A população tende a se tornar mais doadora a partir dos 50 anos, segundo a pesquisa, que cita a aposentadoria como uma das possíveis explicações. Mas, ao comparar com a edição de 2015, há uma queda nos níveis de doação em todas as idades. A única exceção são os mais jovens, na faixa entre 18 e 29 anos, que tiveram um aumento em relação à realização da doação em 2020.
A pesquisa ouviu 2.103 pessoas, entre 16 de março e 22 de maio de 2021, a partir de 18 anos de idade, com renda familiar acima de um salário mínimo e com amostra nacional das 5 regiões do país.
Fonte: Observatório do Terceiro Setor
Por: Mariana Lima
Link da matéria: https://observatorio3setor.org.br/noticias/brasil-registra-queda-em-todos-os-tipos-de-doacao-em-2020-revela-idis/
Link para a pesquisa completa: https://pesquisadoacaobrasil.org.br/